Clancy: Twenty One Pilots encerra uma era revisitando conceitos com criatividade
Banda faz uma viagem por sua carreira com álbum voltado para fãs antigos
Já fazem quase dez anos que o duo americano Twenty One Pilots lançou Blurryface, o quarto e mais famoso álbum da banda. Com ele, iniciaram uma odisséia conceitual — a chamada “lore” da banda, uma história fictícia contada tanto por dentro quanto por fora da discografia.
E, depois de tantos anos imersos nessa história, o duo chega a um ponto final com Clancy, um de seus trabalhos mais coesos até então.
O CONCEITO
O álbum volta ao universo apresentado nos trabalhos anteriores, ainda com os mesmos personagens que os fãs acompanharam durante anos. A sonoridade também segue essa linha, juntando tudo que foi explorado no resto de sua discografia e elevando a um novo patamar de criatividade e dinâmicas auditivas.
Aqui, ainda temos maiores influências do alternativo, com músicas mostrando traços do indie rock e do pop punk já vistos em outras eras da banda, Entretanto, os melhores momentos do trabalho são quando o duo retorna à sonoridade hip-hop eletrônica que os consagrou como um dos maiores projetos da atualidade.
Porém, não é sempre que essa mistura de sonoridades funciona. Muitas vezes, o duo parece ser incapaz de se comprometer com uma ideia apresentada, indo para uma direção ambiciosa apenas para virar bruscamente para o outro lado rápido demais.
A quebra de expectativa e ritmos não é algo necessariamente ruim, mas a direção tomada em alguns momentos não é necessária ou honesta com a própria canção. Além disso, Tyler Joseph, vocalista e principal compositor da banda, se arrisca em algumas técnicas e progressões vocais que ele não consegue reproduzir com perfeição. Isso faz com que ele pareça descoordenado em relação ao seu parceiro Josh Dun — que, por sua vez, dita o ritmo e o sentimento necessário em cada música com perfeição — e ao próprio conceito que estabelece nas letras.
O conceito lírico é, obviamente, uma grande parte do álbum. Porém, não é algo vazio, criado apenas para satisfazer a vontade dos fãs por uma resolução da história. A temática reflete diretamente a vida de Tyler Joseph, letrista principal da banda, e sua luta contra a depressão, tema abordado desde o início de sua carreira.
Talvez por isso Clancy funcione bem mesmo para alguém que não entenda muito o conceito por trás dele. O álbum por si só já expressa implicitamente a necessidade da própria banda de crescer para fora de sua própria história, ainda que a respeitando a mesma.
As referências e a progressão do universo ainda estão ali, mas, dessa vez, focando um pouco mais na expressão do próprio Tyler e de sua realidade, agora completamente diferente do que era quando isso tudo se iniciou.
O trabalho começa com “Overcompensate”, reintroduzindo os fãs a esse mundo estabelecido em álbuns anteriores (“Welcome back to Trench” é um dos primeiros versos, em referência ao álbum Trench de 2018) e as batidas rápidas e quebras de tempo habituais da banda.
“Next Semester” é um ode divertido ao pop-punk, com sonoridade contrastante a letra sombria sobre um surto mental; “Midwest Indigo” segue a mesma pegada sonora da citada anteriormente, enquanto “Routines in the Night” harmoniza produção, voz e letra em uma faixa levemente sexy e melancólica.
Outros destaques do álbum são “Lavish”, com uma influência mais psicodélica, quase como se fosse um remix hip-hop dos Beatles, e “Paladin Strait”, que fecha a narrativa com chave de ouro e reúne muito bem as ideias apresentadas dentro do álbum de forma emocionalmente carregada.
VEREDITO
Em questões de sonoridade, Clancy pode não funcionar 100% do tempo, deixando de explorar com mais profundidade algumas facetas da banda que não foram levadas ao seu limite.
Porém, quando se trata do liricismo, é um prato cheio para os fãs, mostrando mais de como funciona a mente de Tyler Joseph, ao mesmo tempo que encerra a narrativa dos últimos trabalhos da banda de forma emocional. O álbum não chega a ser o melhor da banda, mas com certeza figura perto do alto da lista.