Fresno é livre e direta em Vou Ter Que Me Virar
Nono trabalho de estúdio chega com nova proposta de sonoridade e identidade visual
Quando a Fresno veio com a proposta de lançar 20 músicas novas num intervalo de 35 dias por meio do projeto INVentário, há quem achasse que já era ousado o suficiente. No entanto, Vou Ter Que Me Virar chegou na última sexta-feira (5) para mostrar que não há limites para a banda que hoje caminha para seus 22 anos na estrada quando o assunto é fazer música.
Em entrevista exclusiva ao Downstage, o trio formado por Lucas Silveira, Thiago Guerra e Gustavo Mantovani revelou que a ideia do INVentário sempre foi, de uma certa forma, ser uma “campanha promocional” para o disco — mas cujo resultado acabou sendo ainda mais surpreendente do que apenas ser um amontoado de faixas que estavam guardadas na gaveta e agora viam a luz do sol.
“O álbum estava pronto, quando a gente lançou o sua alegria foi cancelada“, comenta Lucas Silveira durante o bate-papo, referindo-se ao período criativo que foi bem frutífero após a banda disponibilizar o oitavo trabalho de estúdio. “Tinham algumas músicas que iam formar uma versão deluxe do álbum, com remixes e faixas: BROKEN DREAMS, DEUS EX MACHINA, Já Faz Tanto Tempo e Grave Acidente.”
Contudo, com a pandemia de COVID-19 interrompendo a Era sua alegria foi cancelada, os planos para a versão estendida do trabalho foram cortados. Para “movimentar um pouco”, como o próprio vocalista descreve, a Fresno optou por liberar algumas faixas ao longo de 2020 no streaming, como DEUS EX MACHINA, BROKEN DREAMS e o remix de EVA, que conta com a participação da banda Far From Alaska e cujo visualizer entregou o primeiro easter egg da Era Vou Ter Que Me Virar.
“Já tinha alguma coisa acontecendo ali”, relembra Lucas Silveira. “No fim percebemos que a pandemia iria durar mais do que imaginamos, então fomos fazendo mais músicas e desligamos totalmente o Vou Ter Que Me Virar do sua alegria foi cancelada.”
No final das contas, Vou Ter Que Me Virar foi de uma versão extendida do oitavo disco de estúdio da banda para algo 100% único e independente, trazendo identidade visual, narrativa e sonoridade próprias. “Tiramos desse deluxe tudo o que remetesse ao álbum anterior, tudo o que ficou é a faixa-título, que foi feita pra ser ouvida depois do sua alegria foi cancelada“, revela Lucas Silveira.
É claro que nesse intervalo a Fresno ainda encontrou tempo para dividir com os fãs seu projeto mais ousado e livre criativamente: o INVentário, ideia de Thiago Guerra que teve resultados surpreendentes algoritmicamente. “Ele foi feito pra chamar atenção pro álbum, rolou essa ideia de lançar as músicas porque tem muita faixa diferente” comenta o baterista ao Downstage. “Conseguimos entrar em várias playlists diferentes, juntar um público que tava separado ou até mesmo trazer pessoas que nunca conheceram a banda. Conseguimos fazer uma campanha de lançamento do disco sem saber que seria dessa maneira, espalhando bastante o som.”
“Nada como despistar o fã, né?”, brinca Vavo. “Quem imaginaria que viria um álbum novo?”
De fato, o anúncio de Vou Ter Que Me Virar foi algo que pegou todo o público de surpresa ao ser anunciado na faixa INV000, em 13 de outubro. Lançado no dia 5 de novembro, o disco traz uma Fresno mais direta ao ponto, madura e livre.
“Ele é mais focado, a intenção dele já era ser um álbum”, revela Lucas. “Ele já tem uma intenção maior. Eu gosto muito de como o primeiro lado dele soa… são músicas curtas e diferentes uma da outra, bem como as faixas que a gente tocaria num show; enquanto o segundo lado já é mais introspectivo, viajante, com músicas maiores.”
Vou Ter Que Me Virar, ao contrário de sua alegria foi cancelada é um trabalho mais esperançoso, o que já entrega uma mensagem do tipo em seu nome e na faixa-título. Enquanto no oitavo disco de estúdio a temática triste já remetia em algo que não possuia um fim palpável, esse trabalho traz a sensação de se levantar, de ter uma visão boa do horizonte.
É engraçado, no entanto, pensar que um trabalho que está pronto há tanto tempo tenha sido liberado ao público num timing tão certeiro. Com mensagens agridoces, mas sem a nebulosidade do sua alegria foi cancelada, Vou Ter Que Me Virar cai sob 2021 como uma luva, num momento em que os shows ao vivo já são uma realidade mais próxima e que a população brasileira caminha para um número bom de vacinados no país.
“Nesse álbum até mesmo a faixa-título já mostra que eu vou ter que fazer algo a respeito [dessa tristeza]”, conta Lucas Silveira. “Casa Assombrada a mesma coisa; é um papo de saúde mental, de não trazer os problemas para as outras pessoas.”
“Ele tem essa mensagem acontecendo ao longo do disco, uma esperança maior de mudança”, continua. “Algumas coisas vão mudar no próximo ano: o mundo voltando a andar num ritmo que a gente conhece, os shows retornando, o governo Bolsonaro acabando. Acho que tem uma esperança nele e que a gente vive à base dela.”
Além disso, Vou Ter Que Me Virar conta com feats bem especiais em sua tracklist. Um deles é com Lulu Santos, cuja faixa estava prevista para entrar na versão deluxe do álbum anterior. Intitulada Já Faz Tanto Tempo, ela foi gravada há dois anos e é uma daquelas composições que ficaram esperando o melhor momento para serem lançadas.
“Quem você pensa que é para engavetar um feat com Lulu Santos?”, brinca Guerra. “Essa é uma música forte que a gente queria muito lançar, então deixamos ela para dar esse suporte no álbum.” Lucas Silveira complementa: “Músicas tipo essa e participações assim não são coisas que soltamos do nada, a ideia é fazer um hit nosso, crescer, ser um sucesso.”
Nova identidade visual
Assim como todas as outras Eras da Fresno, a identidade visual de Vou Ter Que Me Virar também foi pensada aos mínimos detalhes para sair como chegou aos fãs na última sexta-feira. “Todas essas coisas que a gente ‘some’ é só um pretexto pra voltar com elas eventualmente”, revela Lucas Silveira sobre o novo símbolo da banda, que anteriormente era a tradicional árvore.
“Quem foi que queimou a árvore da Fresno?”, brinca Vavo. A ideia, no entanto, é trazer uma proposta visual totalmente nova para a banda que remete ao clássico do rock. Isso é perceptível na escolha do grupo em revelar as fotos e utilizar cartazes físicos como campanha promocional do novo disco.
“A gente quis buscar essas coisas mais simples, mas que ao mesmo tempo são complicadas de fazer e podem demorar bastante”, revela Lucas. Para chegar ao resultado final, o trio optou pelo processo fotográfico conhecido como cianotipia, feito com compostos químicos expostos à luz solar, resultando em um efeito azulado nas imagens.