Vidaincerta: a face do Emo Rap brasileiro

Músico santista inaugura o Tri$tezaMob, com o primeiro single do álbum ‘O Que Sobrou da Tristeza Vol. 1’ e fala sobre Emo Rap, pretos na cena e reinvenção na carreira

Arte: Marfelo Lacerda / Downstage

Por Caio Pouza

Recém saído do forno, o single O Novo, que inaugura os lançamentos do álbum O Que Sobrou da Tristeza Vol.1 traz uma nova cara para o rapper Vidaincerta e seu som. A música produzida em parceria com Gah Góes nos deixa o gostinho do emo pela letra totalmente focada em relacionamentos e contaminada de sentimentalismo, além do beat do trap casar de maneira única no resultado final do trabalho.

Giba, agora com o pseudônimo Vidaincerta, anteriormente fez sucesso nos vocais da banda Analisando Sara, quando achava estar no auge de sua carreira. No entanto, em entrevista exclusiva ao Downstage, o artista conta que muito do que se via no cenário musical era ilusório, principalmente pra ele que vinha de uma camada social mais baixa do que a maioria dos músicos das bandas da época. “Parecia muito que aquilo se sustentava”, revela. “Eu vivi muito em busca dessa ilusão. Hoje em dia, vejo que é impossível.”

(Imagem: Divulgação)

Após o fim da banda em 2015, houve uma falta de visão de caminho por parte do artista, que não conseguia mais se ver fazendo música. “Eu pensei: ‘eu tenho que parar com isso, tenho que focar em trabalhar em escritório’ sabe?”, desabafa o rapper durante o bate-papo. Ainda assim, tirar o destino musical de sua vida estava fora de cogitação.

Giba buscou evolução, fez mais aulas de canto para se aperfeiçoar e buscar novos ares, já que nunca se considerou um “bom cantor”, como ele mesmo revela. Em paralelo, o atual Vidaincerta acompanhava outros ritmos musicais, como o rap. “A gente tinha uma regra na banda: não valia ouvir rock no carro […] e desde muito moleque eu tava acompanhando esse cenário de batalhas [de rap]”, relembra, traçando sua familiaridade com o som desde muito cedo.

Com o tempo, vieram lançamentos de singles já no beat do rap e novos caminhos começaram a se formar diante de si. “Eu vi no rap um bagulho mais livre pra eu poder me expressar”, diz Vidaincerta, também lembrando de quem o colocou numa nova tendência que casava com suas referências e gostos. “O Niko Kamada, tecladista da Emmercia, me colocou no caminho do trap.”

Representatividade dentro da cena

O Emo Rap já faz barulho na gringa, mas ainda dá os primeiros passos (muito tímidos, por sinal) no Brasil. Em cima disso, o rapper destaca a importância do subgênero para a cena, contrapondo como era difícil e raro uma pessoa preta se sentir parte ou se reconhecer como emo.

Vidaincerta e Fernando Bertuola (Imagem: Divulgação)

“Eu era um negro dentro do cenário emo e hardcore que não me enxergava como negro”, relembra. “Sou lightskin, minhas tattoos coloridas aparecem em mim, então eu já me achava branco.” Giba sugere também que mais pessoas pretas que vivenciaram o boom emo no Brasil lembrem-se e façam questão de se orgulhar em dizer que fizeram parte daquilo.

Com a chegada da pandemia da COVID-19, Vidaincerta começou a repensar o que faria no meio daquele caos. Mais uma vez viria uma reviravolta (positiva) para sua carreira. “Me veio esse desespero de ‘o que eu faço de casa agora?’.”

O resultado foi um dos melhores possíveis: o lançamento do seu próprio selo, o Tri$tezaMob, que ele revela ser um projeto inclusivo dentro do movimento. “No selo a gente tem artistas brancos, artistas do gênero folk, bandas… mas a gente também tem essa parada de também mostrar negros fazendo o que querem fazer”, comenta o músico.

O single inaugural O Novo tem a composição de Gah Góes e já está disponível nas plataformas digitais. No último sábado (2), Giba dividiu com o público o clipe de Emodrill, mostrando a versatilidade do rapper como compositor e produtor num contexto em que é fora de cogitação para profissionais do meio artístico não se posicionarem — por mais que seu trabalho não esteja alinhado à “música de mensagem”.

O clipe de Emodrill foi gravado nas ruas de Santos pelo Lgznegri e dirigido por Fernando Bertuola, trazendo uma música que foi produzida em parceria com o Aladindaleste e que ao mesmo tempo reflete o momento artístico do rapper e a proposta do selo Tri$tezaMob.