20 anos de Take This To Your Grave, do Fall Out Boy

Como o recém-formado projeto de Pete Wentz criou um clássico do pop punk

Arte: Júlia Lima / Downstage

Em 6 de maio de 2003, o Fall Out Boy lançava seu disco de estreia, Take This To Your Grave. Com menos de dois anos de estrada, o quarteto de Chicago tinha como objetivo gravar um material que fosse bom do início ao fim, e ao mesmo tempo, pudesse divertir o público.

Após seu lançamento, o álbum atraiu uma legião de fãs e se tornou uma das grandes inspirações para a cena de novas bandas que viriam. Hoje, 20 anos depois, ele se tornou um clássico pop punk indispensável.

A formação do Fall Out Boy

Em 2001, após alguns anos como vocalista da banda de metalcore Arma Angelus e participações em outras bandas como Racetraitor e Extinction, Pete Wentz se sentia desanimado com a cena de hardcore local de Chicago. Para ele, seus esforços para transmitir uma mensagem e tentar construir um mundo melhor estavam sendo ofuscados simplesmente por “moshs e breakdowns”.

Descontente, ele começou a arquitetar um projeto de pop punk que fosse divertido, e nas suas próprias palavras, “fácil e escapista”. O primeiro a ser convidado foi seu amigo e companheiro de cena, o guitarrista Joe Trohman, que aceitou prontamente. A partir dessa ideia ainda embrionária que viria a acontecer um dos encontros mais famosos e definitivos da cena.

Trohman conversava com um amigo em uma livraria, e os dois tentavam definir o gênero exato da banda de metal Neurosis. Após alguns minutos, ele foi interrompido por Patrick Stump, que de maneira educada (e um pouco esnobe, segundo o próprio) discordou e deu sua própria opinião sobre o tema. 

Os dois engataram em uma longa conversa. Foi quando Joe comentou sobre a nova banda que estava montando com Pete e convidou o recém-conhecido para fazer parte — a princípio como baterista, mas ao ouvirem uma demo em que ele cantava, Patrick foi intimado a se tornar o vocalista. 

O trio convocou outros dois músicos da cena de Chicago, e a banda recém-formada começou a se apresentar e compor músicas inspiradas em influências como Green Day, Descendents e Saves The Day. O nome Fall Out Boy, sugerido por uma pessoa na plateia do segundo show, foi retirado de um episódio dos Simpsons.

Menos de um ano depois, em 2002, já com um EP split em parceria com o Project Rocket, a banda lançaria seu primeiro trabalho completo de estúdio… e não, não era o Take This to Your Grave. Na verdade, antes mesmo de gravar seu debut, o Fall Out Boy gravou Evening Out With Your Girlfriend, lançado pela Uprising Records, que é uma espécie de demo (às vezes chamado de EP ou mini-LP).

Embora hoje esteja nas plataformas de streaming, esse trabalho foi renegado pela banda por muitos anos, inclusive na própria época do lançamento. As razões eram muito simples: eles não haviam gostado do som, já que o registro todo foi gravado em cerca de dois dias, e a banda ainda não estava em sua formação clássica.

Por falar nisso, entre a gravação e o lançamento de Evening Out…, o guitarrista T.J. Kunasch e o baterista Mike Pareskuwicz se retiraram (ou foram convidados a se retirar) do Fall Out Boy após uma curta passagem. Patrick passou a tocar a segunda guitarra, e o convidado para assumir as baquetas foi Andy Bell, um antigo conhecido da cena de Chicago.

O quarteto alugou uma van e saiu em tour pelos Estados Unidos, ainda tocando em locais pequenos e para poucas pessoas. Também começaram a correr atrás de um contrato com uma nova gravadora, que pudesse investir na gravação e lançamento de um trabalho de estúdio.
Depois de conversas com Drive-Thru, Victory Records, Militia Group e Crush, o Fall Out Boy assinou com o pequeno selo Fueled By Ramen, e fez uma espécie de acordo com a Island Records, com a possibilidade de mudar para a gravadora futuramente. Assim, era dado o primeiro passo para a gravação de Take This to Your Grave.

O quarteto, já em sua formação clássica, excursionando em 2003 (Foto: Reprodução / Tumblr)

A criação de Take This to Your Grave

Com um orçamento de U$ 18 mil nas mãos, a banda agendou nove dias de sessões de gravação no Smart Studios em Madison (Wisconsin), estúdio que já havia recebido bandas como Nirvana, The Smashing Pumpkins, Garbage e The Promise Ring. O produtor escolhido foi o ainda jovem e inexperiente Sean O’Keefe. 

Apesar disso, graças à decepção com o Evening Out…, o quarteto já tinha uma ideia bem definida sobre a sonoridade que queria, sendo uma das principais referências o Through Being Cool do Saves the Day, ou seja, um disco em que todas as músicas fossem boas. 

Eles deviam ser certeiros, porque à época, eles tinham apenas doze músicas — as que entraram no álbum.

Aliás, o processo de composição não foi fácil. Como não estavam acostumados a compor juntos, Stump e Wentz discordavam frequentemente a respeito das letras. O vocalista achava que devia cantá-las de outra maneira, e o baixista, por vezes, não gostava do que o colega escrevia, e mudava algumas coisas. Em meio ao caos, as canções acabaram se encaixando.
Por falar em letras, o disco é repleto dos exageros típicos das bandas dessa geração, e que geram muita identificação nos fãs. Em Tell That Mick He Just Made My List of Things to Do Today, o vocalista canta “Eu espero que você se engasgue naquelas palavras, nesse beijo, nessa garrafa”. Já em Chicago Is So Two Years Ago, ele diz “Se você quer desculpas, garota, é melhor segurar o fôlego até sua respiração parar para sempre”.

Palavras assim só fazem sentido por serem cantadas por um vocalista como Patrick Stump. Com um timbre e uma forma de cantar mais próxima da soul music, e uma grande habilidade para criar harmonias, ele se destaca em meio a outros vocalistas de pop punk, e trazia a dramaticidade necessária para esse tipo de música.

O contraponto aparece em alguns momentos mais pesados do disco, como em The Pros and Cons of Breathing e The Patron Saint of Liars and Fakes, que trazem alguns dos riffs mais pesados de Joe Trohman, e os baixos marcantes e vocais gritados de Pete Wentz — homenageando as passagens de ambos por bandas de post-hardcore e metalcore. 

A amálgama é justamente Andy Hurley, basta comparar a diferença entre a bateria das demos e do Take This to Your Grave. Nas canções Calm Before the Storm e Reinventing the Wheel to Run Myself Over, ele demonstra ao mesmo tempo sua velocidade e sua criatividade, preenchendo cada espaço com o que a banda precisa.

Porém, o maior exemplo de como cada um desses elementos pode se destacar e se equilibrar ao mesmo tempo é Grand Theft Autumn / Where Is Your Boy, o principal single do álbum. A canção começa com um refrão pegajoso e uma letra sobre desilusão cantada a capella pela voz soul de Patrick, cresce com os riffs de Joe, enquanto Andy e Pete usam bateria e baixo para criar tensão e continuidade. Certamente, é a obra-prima do álbum. 

Ainda há espaço para as ótimas Dead on Arrival, Grenade Jumper e Saturda, que fazem referência à própria banda e ajudaram a construir o sentimento de pertencimento nos fãs. Tudo isso é coroado pela capa com filtro azulado, inspirada em clássicos do blues.

O legado

Com um excelente disco nas mãos, o Fall Out Boy passou a se apresentar em todos os lugares que podia para divulgá-lo. Aos poucos, eles foram conquistando elogios da mídia e construindo uma base cativa de admiradores, o que ajudou a ampliar o seu alcance.

Até meados de 2005, a banda já havia vendido mais de 300 mil cópias do Take This To Your Grave; hoje, esse número já ultrapassa 630 mil cópias, sendo um disco de ouro nos Estados Unidos e Inglaterra.

Com todo esse sucesso, o FOB se tornou uma grande aposta para muitos críticos, que enxergavam neles uma nova abordagem para o pop punk e o emo dessa geração. Isso também viria a se concretizar, já que o quarteto de Chicago abriu caminho para uma série de novas bandas como Panic! At The Disco, All Time Low, The Maine e Mayday Parade.

O Fall Out Boy se apresentando no The Continental, Nova Iorque, em 2003 (Foto: Guav/Flickr)

Os dois álbuns que seguiram (From Under The Cork Tree e Infinity on High) trouxeram uma evolução da sonoridade apresentada no Take This To Your Grave, mas com o passar dos anos, o Fall Out Boy se enveredou por outros caminhos, mesclando elementos de pop, hip hop, R&B e música eletrônica — embora as músicas do disco de estreia nunca tenham saído dos setlists da banda. 

Recentemente, em 2023, o quarteto lançou So Much (for) Stardust, um álbum que, para muitos, resgatou as características dessa primeira fase. 

O Take This To Your Grave permanece sendo um marco, e já esteve nas listas de melhores álbuns de pop punk de todos os tempos de veículos como Rolling Stone, Kerrang! e Rock Sound. Após vinte anos, é um álbum essencial para compreender esse tipo de sonoridade e a cena que viria após o seu lançamento — ou simplesmente se divertir, de maneira fácil e escapista, como deve ser.